JOSÉ DE SOUZA MARTINS nasceu em São Caetano do Sul (SP) em 1938. Licenciou-se em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia) Ciências e Letras da USP (1964), onde fez o mestrado e o doutorado em Sociologia. É professor associado junto ao Departamento de Sociologia da USP. Foivisiting scholar do Center of Latin American Studies da Universidade de Cambridge (1976). Em 1992 foi eleito fellow de Trinity Hall e titular da Cátedra Simón Bolívar da mesma universidade. Em 1996, o Secretário Geral das Nações Unidas nomeou-o membro, pelas Américas, da Comissão de Curadores do Fundo Voluntário da ONU sobre Formas Contemporâneas de Escravidão.
Entre outras obras, publicou: Conde Matarazzo. O empresário e a empresa (1967), A imigração e a crise do Brasil agrário (1973), Capitalismo e tradicionalismo (1975), Sobre o modo capitalista de pensar (1978), O cativeiro da terra (1979), Expropriação e violência (1980), Os camponeses e a política no Brasil (1981), A militarização da questão agrária no Brasil (1984), Não há terra para plantar neste verão (1986; tradução italiana, 1988), A reforma agrária e os limites da democracia na Nova República (1986), Caminhada no chão da noite (1989),Subúrbio (1992), A chegada do estranho (1993), O poder do atraso (1994), Exclusão social e nova desigualdade(1997), Fronteira (1997).
O texto que aqui se publica - transcrição de entrevistas dadas ao editor de ESTUDOS AVANÇADOS, Alfredo Bosi, em 20 e 27 de maio e em 10 de junho de 1997-foi revisto pelo entrevistado.
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ESTUDOS AVANÇADOS - Qual sua formação, sua biografia intelectual, tanto dentro da universidade como fora dela?
José de Souza Martins - Venho do subúrbio de São Paulo e lá tive a oportunidade de fazer o Curso de Formação de Professores, o chamado Curso Normal, numa excelente escola pública, o Instituto de Educação "Dr. Américo Brasiliense", de Santo André (que faz 50 anos em 1997). Foi lá no "Américo Brasiliense" que tive contato indireto com a Faculdade de Filosofia da USP.
Quase todos os professores da velha escola pública de ótima qualidade daquela época eram professores concursados, e vinham da USP, em particular da Faculdade de Filosofia. Durante o curso, apesar de motivado pela idéia de ir para a roça, me senti muito atraído pela sociologia - uma das disciplinas do curso - e resolvi tentar a universidade. Passei no vestibular, na turma de 1961, e acabei me dando muito bem no curso de Ciências Sociais.
Na Faculdade fiz o bacharelado e a licenciatura em Ciências Sociais, que concluí em 1964. Em 1966, fiz o mestrado em Sociologia. E, em 1970, o doutorado em Sociologia. Em 1973, recebi uma bolsa de estudos do British Council para participar de um seminário de estudos, de quase dois meses, na Universidade de Sussex, na Inglaterra. Em 1976, voltei à Inglaterra por um período de sete meses a convite do Center of Latin American Studies da Universidade de Cambridge, como Visiting Scholar. A Universidade da Flórida convidou-me para ser professor-visitante (Mellon Visiting Professor) no Amazon Research and Training Program, do Center for Latin American Studies, em Gainesville (EUA), em 1983.
Em 1992, fui distinguido com minha eleição como professor-titular da Cátedra Simón Bolivar, da Universidade de Cambridge, para o ano académico de 1993-94. Fui o terceiro brasileiro a ocupar essa Cátedra, ocupada antes por Celso Furtado e por Fernando Henrique Cardoso. E fui o terceiro sociólogo. Além de Cardoso, Pablo González Casanova também a ocupara. Essa Cátedra constitui a mais alta distinção que a Universidade de Cambridge concede a intelectuais latinoamericanos, e vem acompanhada do título de Master of Arts, que ela concede exclusivamente a quem tenha sido seu aluno. Nomes ilustres me antecederam: Octavio Paz, Carlos Fuentes, Mario Vargas Llosa, Gustavo Gutiérrez, Beatriz Sarlo, além dos ja mencionados.
Como é tradição em Cambridge, ao ser anunciada minha eleição aos colleges, fui imediatamente eleito fellow de Trinity Hall. Trata-se de um dos colleges mais antigos e seguramente um dos mais acolhedores. Sir John Lyons, o famoso lingüista, recebeu o meu juramento ao pé do altar na capela medieval do College, no dia 12 de outubro de 1993. Minha posse foi solene, na presença de todos os fellows, revestidos de seus paramentos e insígnias, e dos alunos do doutorado, que depois me conduziram em procissão ao hall para o banquete de recepção. Essa honraria representa um privilégio até o fim da vida, pois me permite hospedar-me no College e ali trabalhar todas as vezes que vou a Cambridge. Tenho feito isso ao menos uma vez por ano, durante períodos variáveis, geralmente de um mês. Com isso, tenho acesso fácil aos recursos da Universidade, especialmente suas notáveis bibliotecas. Cambridge tem duas Cátedras desse tipo: além da Simón Bolivar, a Cátedra Pitt, para intelectuais norte-americanos. Meu College recebeu no passado um titular da Cátedra Pitt, também sociólogo: Talcott Parsons.
Em 1992, pouco antes de ir para Cambridge, fiz minha livre-docência no Departamento de Sociologia e dele me tornei professor-associado.
Tenho feito parte do conselho editorial de várias revistas científicas. Nessa área, o trabalho mais importante foi na revista Debate & Crítica, cujo nome, mais tarde, foi mudado para Contexto, por causa dá censura da Polícia Federal. Éramos três diretores: Jaime Pinsky, Florestan Fernandes e eu. Um ano depois, integrou-se ao grupo Tamas Szmercsányi. A revista tinha forte presença de professores da Faculdade de Filosofia da USP, especialmente de professores cassados em 1969. Ela funcionou de 1973 a 1978.